sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Um sonoro silêncio

O compositor austríaco Anton Webern pertenceu ao conjunto de autores que, no início do século XX, encaminhou a música na direcção da atonalidade, isto é, a ausência de harmonia baseada nos acordes tradicionais.

Alex Ross, no seu livro O Resto é Ruído, descreve de forma muito interessante um trecho da obra Seis Peças, opus 6 de Webern, composta em 1909-10. Aqui fica a descrição e um vídeo, no qual a passagem a que Ross se refere tem início aos 3:50 e demora cerca de 4 minutos.

A meio da sequência há uma procissão fúnebre que começa com uma agourenta tranquilidade, com um ressoar de tambores, de gongos e de sinos. Diversos grupos de instrumentos, entre os quais predominam os trombones, gemem acordes de cariz inerte e contido. Um clarinete toca uma melodia aguda, lamuriante e envolvente, em mi bemol. Uma flauta alto responde com timbres baixos e roucos. Uma trompa e um trompete produzem em surdina outros fragmentos líricos e acordes subterrâneos. É então que os trombones soltam um grito e os sopros e metais os seguem. A peça termina com uma sequência esmagadora de acordes de nove e dez notas, após as quais a percussão inicia o seu crescendo que culmina com um rugido que liquida qualquer tom. E assim começou a idade do ruído. (...)

As obras de Webern estão suspensas num limbo entre o ruído da vida e o silêncio da morte. A facilidade com que um se funde no outro significa que das suas obras emana uma percepção filosófica clara e profunda. O crescendo na marcha fúnebre da Opus 6 está entre os fenómenos musicais de maior volume sonoro da história, mas ainda mais sonoro é o silêncio que se lhe segue e que fere os ouvidos como um trovão.



Alex Ross
O Resto é Ruído - À Escuta do Século XX
Casa das Letras, 2009

Anton Webern
(1883-1945)
Seis Peças, opus 6
Orquesta Joven de la Sinfonica de Galicia (OJSG)
David Ethève (maestro)

0 Comments: