domingo, 6 de setembro de 2009

Cardápio eleitoral da Tasca do Silva

Vale a pena ler e analisar com atenção os programas eleitorais dos partidos políticos. Eles são fonte inesgotável de ensinamentos que podemos utilizar em diversas situações, elevando substancialmente o nível do discurso e das práticas. Aqui na Tasca, por exemplo, os programas eleitorais estão a ser usados para renovar o atendimento. E esta acção começa já a dar frutos que nos parecem muito interessantes.

Eis um exemplo gravado em áudio na passada sexta-feira, quando entrou o primeiro cliente do dia, eram onze horas e cinquenta e dois minutos:

- Bom dia, já se pode almoçar?
- Ali no restaurante em frente ainda não pode almoçar, mas aqui sim.
- E que tem hoje que se coma?
- Garantimos a efectiva confecção de diversos alimentos, de forma a poder satisfazer as suas mais exigentes necessidades alimentares.
- E o que tem pronto a sair?
- Providenciamos uma vasta selecção de pratos tendo em vista vários regimes alimentares.
- Sim, mas diga-me alguns…
- Providenciaremos não apenas alguns e faremos um esforço para acompanhar os seus pedidos, seja qual for o prato que queira.
- E que pratos tem?
- As nossas propostas são ambiciosas, mas realistas.
- Por exemplo?
- Acompanhamos com especial atenção os PME, os pequenos e médios estômagos. Os micro e PME portugueses são parte essencial da sustentação dos sectores mais modernos e dinâmicos da gastronomia.
- Não é o meu caso, eu gosto de comer bem, em quantidade.
- Privilegiamos não só a quantidade, mas também a qualidade, tendo para isso feito um programa de modernização de toda a cozinha.
- Ok, traga-me a lista…
- As nossas prioridades não estão centradas em listas mas sim no reforço de um serviço inovador…
- Desculpe, não estou a perceber, afinal tem ou não algo que se coma?
- Os nossos objectivos não se confinam à comida, garantimos também um apoio completo à bebida.
- Isto é que é uma gaita! Olhe, acha que devo comer aqui ou no restaurante do outro lado da rua?
- Reforçaremos os mecanismos para criar condições que permitam ajudá-lo a tomar a decisão mais conveniente nessa matéria. Já comparou os nossos pratos com os do restaurante concorrente?
- Ainda não. Que pratos têm aqui, afinal?
- Os nossos pratos renovam a ambição de garantir uma competitividade sustentável assegurada por uma transversalidade de funções consolidadas no quadro de uma vasta…
- Desculpe, já não aguento mais e estou cheio de fome. Traga-me um bife grelhado com legumes cozidos.
- E para beber?
- Uma cerveja preta.
- Os seus desejos são ordens. Iremos trabalhar afincadamente para satisfazer o seu pedido nos próximos quatro anos.

2 Comments:

PJ said...

Tão brilhante escrito, devolveu-me à memória a associação que, desde os loucos anos 80, faço entre a política e a comida (algo me dizia que, no futuro, iria necessitar disto para usar na Tasca).

Concretizando, falo da relação entre a demagogia e o queijo, feita por essa diva nacional dos eightys, Lena D'água, à época uma grande febra (lá está, de novo, a comida), com a vantagem de ser irmã e filha de dois grandes símbolos do glorioso.

Cantava ela, para quem não se lembra da profundidade desta diálise politico-social:

Dão nas vistas em qualquer lugar
Jogando com as palavras como ninguém
Sabem como hão-de contornar
As mais directas perguntas

Aproveitam todo o espaço
Que lhes oferecem na rádio e nos jornais
E falam com desembaraço
Como se fossem formados em falar demais

Demagogia feita à maneira
É como queijo numa ratoeira


P’ra levar a água ao seu moinho
Têm nas mãos uma lata descomunal
Prometem muito pão e vinho
Quando abre a caça eleitoral

Desde que se vêem no poleiro
São atacados de amnésia total
Desde o último até ao primeiro
Vão-se curar em banquetes, numa social

Demagogia feita à maneira
É como queijo numa ratoeira

Vitor Oliveira said...

Efectivamente Comida e Política sempre andaram de braço dado !

Desde Carlo Petrini, fundador do Movimento Slow Food, que sustenta que “(...) a gastronomia pertence ao domínio das ciências, da política e da cultura(...). É ele quem pensa que (…) a gastronomia pode constituir uma ferramenta política de afirmação das identidades culturais e um projecto virtuoso de confronto com a globalização em curso (...)”. E refere ainda que “(...) por trás de cada alimento tradicional, saboroso e ecologicamente sustentável, há séculos de saber, de inteligência e de criatividade.(...)” …..

….. até Cavaco Silva, neste precioso momento de degustação natalícia http://www.youtube.com/watch?v=KOWmcmbGp18

…... passando por Paulo Portas, numa rara ocasião de lucidez que não só revolta o estômago e faz perder o apetite a qualquer um ( veja-se quem o acompanha neste debate ) como ainda nos mostra que, à frente de todos estes aqui presentes, só faltava mesmo ….. uma mesa bem recheada ! Só não sei é do quê ! Veja-se aqui http://www.youtube.com/watch?v=14yM2ioAHRc