domingo, 31 de agosto de 2008

Manias e preconceitos

Os feitos do atleta Francis Obiorah Obikwelu durante anos não despertaram qualquer interesse em Portugal, pelo simples facto de ele ser um cidadão nigeriano. Mas o interesse subiu e generalizou-se no nosso país a partir do momento em que Francis passou a ter a nacionalidade portuguesa. Um simples acto administrativo mudou a forma como passámos a ver a actividade daquele atleta.

Nos meus arquivos de bagatelas e preciosidades, conservo um cartaz que uma escola do ensino secundário, há já uma boa dezena de anos, usou para publicitar uma actividade. Essa actividade era de divulgação musical e tinha por título "Por que é que a música clássica é tão chata?". O cartaz tornou-se uma curiosidade porque um aluno escreveu nele um rotundo e categórico "Foda-se a escola". Aquilo que eu acho mais significativo nesta relíquia é que a antipatia em relação à escola conseguia, neste caso, ser ainda maior do que aquela que, sem dúvida, o aluno teria em relação à música clássica.

Uma serpente, mesmo que inofensiva, causa calafrios e medo a quase toda a gente, apenas porque é uma serpente. Milhares de pessoas são indiferentes à música clássica ou até a detestam, apenas porque ela é música clássica. Todos estes exemplos mostram como há um certo tipo de rótulos que atribuem um valor de preconceito a tudo quanto existe à face da Terra, sejam pessoas, nações, animais, instituições, obras de arte ou resultados desportivos.

Se eu vos convidar para ouvir o belíssimo tema principal do segundo andamento da Sinfonia n.º 1 do compositor português Luís de Freitas Branco, imagino que poucos aceitarão o convite. Bah! Música clássica e, ainda por cima, de um reles compositor português! Que isto do nacionalismo português dá para os dois lados - glorificam-se umas merdas sem interesse nenhum ao mesmo tempo que superiormente se denigrem sólidos valores e mesmo riquezas absolutas. Mas esta mesma música decerto iria comover toda a gente que a ouvisse num aclamado filme americano, caso ela tivesse sido escolhida como leitmotiv do simpático e nostálgico herói, a quem tudo acabou por correr bem para maior contentamento do espectador.

Querem experimentar? Ora então fechem os olhos, imaginem a cena e ouçam os 2 minutos anteriores ao The end deste inexistente filme.




Luís de Freitas Branco (1890-1955)
Tema principal do 2.º andamento da Sinfonia n.º 1
RTÉ National Symphony Orchestra (Irlanda)
Maestro Álvaro Cassuto
Naxos (8.570765), 2008

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