segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

THE T-FILES – Encontros Imediatos do Grau Esquisito (I)


TASCA DO SILVA

4ª FEIRA – 21H30

- Praticamente crescemos os dois juntos...- lamentou-se Parménides Juvenal afogado na sua dor e olhando para o fundo do copo, que repousava vazio no balcão da Tasca. Enquanto quebrava a casca a uns ovos cozidos para servir no dia seguinte, o Silva procurava que aquele jovem de 40 anos tomasse consciência de si.

- Não achas que por hoje já chega?

- Era mais uma gasosa, faz favor! - continuou Parménides sem atender ao que lhe dizia o taberneiro, que para não contrariar o seu cliente, e porque não era do seu feitio prejudicar o negócio, serviu-lhe uma gasosa pela terceira vez, aumentando o estado de alienação na exacta medida do seu desgosto - ...era um grande amigo, sempre disposto a ouvir-me, nunca se negou quando eu tinha de desabafar algum problema, eu sabia que a qualquer hora que precisasse ele estava ali e eu podia contar com ele...nunca pensei que fosse tão duro ver partir assim um amigo! Nem quis ver quando o meu pai o largou na sanita e puxou o autoclismo...

- Como?... - espantou-se o Silva, quase entornando a gasosa no balcão.

- ...pois é, nunca me esquecerei do meu peixinho vermelho...

O Silva rolou os olhos e mirou o relógio do Benfica que, na parede de fino azulejo Viúva Lamego, marcava o imparável caminhar dos ponteiros a caminho das dez.

- Não será melhor eu levar-te a casa?

- Não, mas é melhor eu ir andando, se eu chegar a casa depois das dez é capaz de a minha mãe se chatear e já nem me dá o banhinho antes de deitar...

Massacrado pela perda do ente querido e por 3 gasosas nunca antes tomadas de uma assentada, Parménides saiu para a rua, indo ao encontro da noite fria, que lhe despertou os sentidos do torpor produzido pelo dióxido de carbono da bebida. Num movimento pendular semelhante ao de um limpa-pára-brisas caminhou entre o passeio da esquerda e o da direita, escutando os seus passos no empedrado, agora que todo o bulício do bairro cessara no exterior, transferindo as actividades físicas nocturnas para o interior da casa de madame Sissi.

Parménides ía a meio da Travessa do Berbigão quando, subitamente, após um estrondo seco, os candeeiros da rua se apagaram todos, deixando-o apenas com a fraca companhia da lua, ainda em quarto crescente. O seu pequeno coração começou a palpitar mais intensamente quando foi tomado pela estranha sensação de estar a ser observado, sem saber muito bem de onde. Um arrepio percorreu-lhe a espinha de cima a baixo, logo seguido de um fenómeno idêntico em sentido inverso, pelo que decidiu alargar o passo.

De repente, algo o surpreendeu não conseguindo conter um pequeno grito de medo. À sua frente, em enormes letras vermelhas, estava a palavra “MORTA”! O nó que se lhe formou na boca do estômago acalmou um pouco quando percebeu que se tratava de um cartaz publicitário do Lidl, anunciando “Mortadela a 1,29 €”.

O seu passo foi de novo apressado quando ouviu o som nítido e não distante de lobos uivando à lua cheia, o que era tanto mais estranho quanto a lua estava em crescente e ao fundo da rua só se viam 2 cães vadios. Atalhando pelas traseiras da Tasca, Parménides não reparou no cadáver carbonizado de uma ratazana junto de um poste de alta tensão recentemente instalado, e que exalava um odor de morte. Contudo, não pôde deixar de reparar em algo que, no meio da rua, o fez estacar o passo, estarrecido.

Uma figura estranha, algo retorcida mas ao mesmo tempo de silhueta humanóide, irradiava uma aura em tons de verde, como que um brilho que acompanhava todo o corpo, simultâneamente atraente e repulsivo, e que estendeu um braço na tentativa de estabelecer contacto.

E então, a criatura emitiu som.

Uma voz grave e rouca, com um sotaque que, dir-se-ía numa disparatada comparação, semelhante ao de um emigrante de leste, falou:

- Não ter medo, senhor... - pareceu-lhe ouvir em português.

O cérebro de Parménides perdeu o controlo sobre o seu corpo e a razão cedeu lugar à emoção. O seu coração disparou a ordem, a bexiga aliviou-se e as pernas desataram a correr o mais rápido que podiam, a caminho de casa.

2 Comments:

Pinto Madeira said...

HA HAHAHA HA HA H HA H HA H A HAHA HA HA HAAAAHHAHA

adoro suspense....

[PM com pelos braços em pé]

teva said...

bbrrrrr...

[teva com 2 unhas roídas no canto esquerdo]